Eu não tenho foto do dia do meu casamento, nenhum registro, nada.
Um dos caprichos da juventude é esnobar as tradições, e fingir que se serve delas apenas por conveniência. Diante de razões e contra-razões, nós nos dissemos que casaríamos por um motivo real, uma conclusão lógica, uma rebeldia pragmática: a nossa aventura só abria concessões ao plano de saúde da empresa.
Chovia forte no dia do meu casamento, que nem chamava casamento, chamava “a assinatura”. Então, assim: nós assinamos os papéis sem nenhum cumprimento da natureza, só nós num cartório numa rua alagada. Estiveram presentes meus pais, únicas testemunhas do ato, porque duas eram necessárias, e nenhum amigo ou festa estava previsto.
Para um casamento assim discreto, Paulo decidiu usar sandálias de couro, foi aí que eu fiquei irritada — no último minuto, um tracinho de vaidade e apego ao ritual apareceu.
Contem isso sobre mim, depois que eu morrer: no dia do meu casamento eu vestia jeans e um discurso desapegado mas, por baixo da jaqueta, uma blusa de seda, delicada e branca.
